Tendo presente a origem etimológica da palavra cultura, proveniente do latimcolere (cultivar), percebemos através da evolução do homem em seu convívio social que este, em seu caminhar, dedicou-se a prática do “cultivo”, em seus vários segmentos. Um dos campos férteis encontrado pela humanidade foi o das ideias, no qual vimos o florescer das ciências do cultivo do pensamento, ou seja, da filosofia como ciência, capaz de nortear o homem em seu processo de enlevação, diferenciando o Homo Sapiens dos demais animais e existentes na natureza.
Um dos aspectos mais importantes neste processo de diferenciação do homem ocorre através de sua capacidade de atribuir significação simbólica aos elementos de seu convívio social, além da capacidade de deixar registrada sua trajetória através de sua produção material. De maneira ampla, esta concretização da ação humana pode ser entendida como arte, referindo-se não apenas à produção artística, mas enquanto toda produção humana relacionada a uma racionalidade.
Contudo, ainda que seja possível entender a cultura como tudo aquilo que o homem produz, é preciso diferenciá-la do entretenimento cultural, campo do prazer e da fruição e estético. A música, o teatro, a escrita e a dança, embora possam motivar estas experiências sensíveis, são manifestações artísticas, partes, portanto da ideia de cultura, mas não podemos ficar presos às esferas da arte sob pena de reduzirmos o conceito de cultura, tomando-a como o elemento massificador da identidade.
Quando se define a cultura como uma das principais características humanas é porque a produzimos e sofremos sua influência desde que nascemos. Enquanto tradição de um povo, ela é passada de geração a geração, não de forma individual, mas através da própria inserção em um grupo social. Daí decorre que a cultura possui a capacidade de permanecer estável mesmo com tantas mudanças no mundo.
Tudo aquilo que um determinado grupo construiu ao viver numa sociedade pode ser entendido como cultura, seja apenas um hábito alimentar desenvolvido devido à possibilidade da agricultura ou uma vestimenta feita de um animal particular de uma área geográfica. Toda essa rede cultural (crenças, valores, costumes, línguas, etc) é essencial para a formação cultural de um povo por ser um fator de enriquecimento da humanidade.
Atualmente, é fácil notar as diferentes culturas ao redor do mundo e como, devido à globalização, estão cada vez mais interligadas. A língua ainda se mostra um dos fatores mais fortes para reunir um povo e estruturar um conjunto de leis de convívio. Mesmo com a extinção de centenas de idiomas nos últimos anos, a cultura formada a partir delas ainda finca-se nas raízes culturais daqueles que não mais as utilizam.
Antes de tudo, a cultura leva em consideração o contexto histórico que nos faz agir como agimos. Para além dos limites das artes, cultura envolve também as formas como fomos criados, o que nos leva a refletir de uma determinada maneira e, talvez, chegarmos a certas conclusões. Enfim, a cultura pode ter vários significados e várias ramificações, estabelecidos a partir do ponto de vista de quem a descreve/interpreta.
Assim, a cultura pode ser entendida como o conjunto de respostas e criações do ser humano para satisfação de desejos e necessidades ao longo do tempo. Neste sentido, não podemos esquecer, segundo Rousseau, das dimensões dos “usos”, “costumes” e da “opinião”. Além disso, considerar, nesta tentativa de conceituar cultura, as reações e reflexões que causam nos seres humanos as próprias obras, usos e costumes, etc.
A ideia de ser a cultura o conjunto de conhecimentos e percepções que aprendemos desde criança remete, talvez, ao apontamento rousseauniano, no seu 14º discurso: “Não somos corrompidos pela natureza, que nos faz nascer em estado de inocência, mas pela sociedade”. Essa declaração de Rousseau vai de encontro ao pensamento sociológico formulado por Emile Durkhein, para o qual “o indivíduo nasce da sociedade e não a sociedade do individuo”.
Segundo Kant, são duas as exigências fundamentais da ideia de cultura: a primazia da ideia de homem e sua universalidade. No entanto, a partir das observações de Max Weber, para quem a sociedade pode ser compreendida a partir das ações do indivíduo, essa universalidade da cultura passa a ser questionada e substituída por uma ideia de diversidade, o que só aumenta a dificuldade de conceituação.
Marilena Chauí, em seu livro Convite à filosofia, diz: “A vida ética realiza-se plenamente quando interiorizamos nossa cultura de tal maneira que praticamos livremente seus costumes e valores (…) sem deles duvidarmos porque são como nossa própria vontade ou desejo”. Percebe-se a coerência do conceito formulado por Chauí, não obstante o fato de que a internalização de valores e costumes nos inflige, mesmo que inconscientemente, limitações a nossa liberdade, que podem, inclusive, ser questionadas do ponto de vista cultural.
(Texto coletivo elaborado pelos alunos do primeiro semestre do curso de Política e Produção Cultural, da Universidade Federal do Pampa – Campus Jaguarão)