E Viva o Drama – Crítica Drª Ana Lúcia Montano Boéssio sobre o espetáculo “A Dama da Noite” encenada pelo discente e ator Breno Santareno. A atividade encerrou a III Semana Acadêmica de Produção e Política Cultural.

E VIVA O DRAMA!                                                                                                                                20/09/2019

Ontem, tomei uma decisão radical, decidi espantar os  fantasmas que rondam meus pulmões e me entregar ao drama. Sim, fui ao teatro em Jaguarão. E como não estamos falando de qualquer cidade, mas da reconhecidamente cidade “Heroica”, obviamente não se trata aqui de uma experiência ordinária – o sítio escolhido não foi o belo Theatro Esperança, mas uma velha casa abandonada, por muitos considerada morta, e que os alunos do curso de Produção e Política Cultural da UNIPAMPA-Jaguarão tiveram a sensibilidade de resgatar da morte, dialogar com ela e ressuscitar a sua alma porque, sim, as casas tem alma (concessões de literata!).

A casa em questão faz parte dos causos da cidade, tem uma alma “noturna”; dizem que pertenceu a uma jovem noiva que não teve seu casamento consumado no dia da cerimônia
devido à morte de seu amado. A noiva-espírito, então, decidiu permanecer na casa que deveria ter sido a morada da sua felicidade – mais, não posso dizer, não quero incorrer em
inverdades. O que importa é que foi nesse clima que a Dama da Noite, monólogo de Caio Fernando Abreu, foi brilhantemente encenada em meio aos escombros, como uma alma se erguendo das cinzas. Isso tudo com a ajuda de Éolo, deus dos ventos na mitologia grega, o qual não poupou esforços por entre as não-portas e não-janelas da casa – cenário perfeito! Porém, a Dama, encarnada pelo nosso aluno/ator, Breno Santareno, não se intimidou, ela também conhece as forças por onde circula, e abrindo seu manto enrolou cada parede da casa da noiva triste e fez delas sua armadura. Altiva e sombria, afinada e dramática, envolveu seus espectadores e fez deles seus cúmplices; ela não era mais a única “fora da roda” e, com a força da sua voz, desvelou suas múltiplas faces, as dores várias e sombrias de muitos eus, tus, vocês, eles…

Há quem defina o texto de Caio F. Abreu como um texto queer; isso pode ser fácil. Difícil é ultrapassar as armadilhas de uma estética erótica, de linguagem chula, pensada para chocar, e adentrar as camadas subterrâneas do texto, lá onde o drama não se resume a um tema, onde os porões são escuros porque é lá, na sombra da noite, que habita o humano frágil, desnudado, doído, invisível. A Dama de Breno nos tocou, nos atacou, nos enredou como uma hera subindo pelas paredes de uma casa abandonada, e nos presenteou com humanidade.

Parabéns ao curso; parabéns a todos os envolvidos na montagem e organização; parabéns à UNIPAMPA; parabéns a nós, reles mortais que tivemos a coragem de afrontar os ventos e as sombras da casa ressuscitada para viver um raro momento de ARTE!

Profa Ana Boessio

Ps. Imagem divulgação atividade: